quarta-feira, 1 de abril de 2015

Eu e meus óculos



Depois de 25 anos juntos, decidimos consensualmente nos separarmos.
Nenhum divórcio é fácil. E muitas vezes os velhos hábitos me levaram ainda a procurá-lo em vão.
Foi aos 7 anos que nos conhecemos, ele me permitiu enxergar o mundo, que a principio parecia um tanto embaralhado.
Assim como eu, cada período de nossa existência juntos, ele assumiu diferentes estilos.
Sempre em mim, ao lado ou por perto, éramos inseparáveis.E devo a ele, tudo que a vida me permitiu ver ou viver. Sempre me sentia um tanto perdido sem ele e com o tempo, tudo em nossa rotina, passa fazer parte do que somos. Como uma extensão do próprio corpo!
Talvez não tenhamos a percepção correta da importância de cada coisa, até que tenhamos algum distanciamento para observar plenamente.
E hoje minha despedida é com gratidão. Um distanciamento amigável, talvez até um futuro, que nos reencontremos.
Repousado sobre a mesa, segue espelhando o entorno, agora com angulações diferentes da minha.
Dizem que o amor não prende, mas antes liberta. Logo seguimos livres, mas ainda nos amando!
E gradualmente começo a enxergar detalhes simples que nunca me foram permitidos antes: tomar um banho, deitar sem preocupações na cama e
no futuro ver o mar (Como muitos mineiros e tenho o sangue dos mesmos, tenho esse fascínio, ainda que mesmo morando próximo, entrava na água,
sem poder admirá-lo em sua imensidão, pois sentir e enxergar eram diametralmente opostos).
Talvez por alguns instantes, tenha compreendido a maravilha de enxergar. E plagiando uma grande mensageira Hellen Keller (defensora dos direitos femininos, cega e surda): "Nunca entendi ao perguntar como estava o dia, alguém responder-me: nada demais! Eu que sou cega, sinto a textura de uma arvore, a vibração de uma voz, as irregularidades do caminho que piso...E quem tudo vê, me responde: nada demais?"
Talvez o muito pareça pouco para quem sempre teve em abundância. Agora partilho o mundo que todos vêem. Que faça-se a luz.

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