sexta-feira, 30 de junho de 2017

Avidez



Há ânsia no desejo
O prazer não sabe ser comedido
Comensurado ou simplesmente aguardar
Ele é a entrega inesperada
Que só espera o consumar
Somar, só mar
Porque nos banha em ondas
Mergulhos profundos
Ainda quando só imaginação
Ele é imaginação, mesmo quando fato
É o entrelaçar entre duas mentes
Que se saciam, aliciam e deliciam
É a pretensão do tesão
É a tensão que escorre
Que sua e faz suar
Corporificam as fantasias
Em uma busca ofegante
Que oferta o melhor
Que no íntimo do imo há

terça-feira, 27 de junho de 2017

Tudo ou Nada


Não sei ser ponderado
É sempre assim: tudo ou nada
Ainda quando o tudo parece nada
E nada é como tudo parece
Nascemos com tudo
Morremos por nada
Criamos o tudo a partir do nada
E quando desalentados, o nada é tudo
Há detalhes em tudo
Há segredos no nada
Falo com tudo, o nada que há em mim
Murmuro sobre o nada que há em tudo
Porque parte é o que deixo inteiro
Parte é o que não sobra, ainda que sombras
Enquanto crio pontes entre um e outro lado
Voo manco e calado

domingo, 25 de junho de 2017

O elevador


E eles entraram...
Toda espontaneidade deu lugar a um estranhamento.
Os primeiros, logo ocuparam os cantos e se puseram em posição rígida, como uma armadura decorativa.
Houve um certo constrangimento e confusão com os botões.. Todos queriam apertar e se livrar logo da situação para retornarem às suas posições.
Segundos depois, alguns sacaram o celular e fixaram os olhos nele na vã tentativa de se isolar em um cubículo de 1,5 x 1,5 m.
Tentavam, inutilmente, distrair a mente, mas as demais presenças se impunham.
Uma moça até se virou de costas para os demais, encarando o espelho e penteando os cabelos. Esqueceu que o espelho refletia, logo ela via todos e percebeu que também a viam.
Os demais não sabiam o que fazer. Olhavam para o mostrador, torcendo que em um passe de mágica, o décimo andar se tornasse o térreo. Olhavam para cima, para baixo, para os lados,...Colocavam as mãos nos bolsos, nas bolsas, entrelaçavam as próprias mãos, estalavam os dedos...Tudo parecia em câmera lenta.
Ninguém ousava falar uma palavra. (Na verdade, mal respiravam)
Cada um que saltava em um andar pelo caminho, devolvia um pouco do ar preso pela apneia dos demais. Alguns, um pouco mais aliviados, quase suspiravam.
E depois de um minuto, que pareceu uma hora, chegaram no térreo e aceleraram os passos o quanto puderam para se perderem uns dos outros.
Eles sabiam demais, compartilharam a privada proximidade.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Sentido e Significado


Sentido é sentir
Significado é signo

Sentir é a sensibilidade da alma
Signo é a intensidade do símbolo

A alma é expressão
O símbolo é a codificação

Expressão é manifesto
Codificação é a síntese

Manifestação é movimento
Síntese é interpretação

Movimento confere direção
Interpretação gera compreensão

Tudo é o significado do sentido
Tudo é o sentido do significado

Sinto, logo significo
Enfim, significo por sentir

segunda-feira, 19 de junho de 2017

O artista


O artista pode ser tímido
Mas sua arte é despudorada
Ele veste o corpo
Mas desnuda a alma
Ele disfarça as emoções
Com a intensidade que emociona
Empresta sua sensibilidade
Aos milhares que habitam o seu ser
Ele pode não ser tocado
Mas o que faz, deve tocar
Tirar do lugar comum
Que o costume faz estar
Um estranhamento
Que desnorteia ao êxtase
De se perder no mundo
À descobrir o mundo perdido
Não cabe o morno na arte
Porque assim já é o cotidiano
Arte é a entrega
Que dá, mesmo sem receber
Que confia, mesmo sem gratidão
Que se importa, mesmo sem entendimento
Até que as cortinas se fechem
As luzes se apaguem
O grafite deslize
E um ponto se faça
A corda vibre
E o som se dissipe
E a arte viva, mesmo sem o artista

terça-feira, 13 de junho de 2017

A insatisfação



A insatisfação humana nasceu para nos fazer sair de onde estamos. Especialmente, fazer-nos descobrir o mundo dentro e fora de nós. Mas o que deveria ser um alerta, assumiu o controle. A insatisfação que deveria apenas sinalizar ou até mesmo motivar uma mudança, gerou uma ânsia compulsiva para reclamar e se ancorar em um lugar comum: a zona de conforto. A desconfortável sensação que deveria ser um convite e empurrão, se tornou a experiência que deve ser evitada. Negando também, tudo que poderia vir junto e que nem nos permitimos vivenciar."Quero isso, mas isso é assim e assado, deixa para lá". "Não estou bem aqui, mas como não sei o que tem lá, aqui é melhor" 
Acabamos em um "looping"(espiral) infinito: "se não for exatamente como imaginei não quero e assim", nos distanciando de viver o que queríamos. Reclamando por não ter o que poderia ter tido se a insatisfação não tivesse afastado.
Retomar a origem da insatisfação, não é um caminho fácil, após uma estrada sinuosa e esburacada. Insatisfação é o negativo de satisfação (Satis-suficiente + facere-fazer do modo desejado), logo é a "insuficiência de não fazer do modo desejado" e se o modo não é desejado, deveríamos mudá-lo. As coisas não se fazem sozinhas. E se não é suficiente, deveríamos buscar o que falta e não aguardar que o que falta se complete sozinho.
Insatisfação não é movimento passivo, é ativo e essa é a aparente contradição.
Insatisfação exige uma nova ação! Sem movimento, tudo que conseguimos é uma insatisfação pela própria insatisfação.

domingo, 11 de junho de 2017

Atração ou Repulsão


Sempre julguei que atração ou repulsão tivessem uma explicação lógica, mesmo que fosse inconsciente. Algum gostar ou não, baseado em expectativas, fossem elas: beleza, carreira, jeito, objetivos, etc...Apesar de comumente tentarmos justificar através destes argumentos, creio hoje, que não passem por isso. Que na verdade, sejam pontos levantados para definir algo que não pode ser definido: algo químico/emocional que vai além da lógica.
O corpo se altera, a percepção sobre as pessoas também, independe dessas terem ou não os atributos esperados. Os pensamentos começam a tentar racionalizar o processo e dar sentido à experiência. E isso deve explicar como pessoas tão diferentes ou que buscavam coisas tão diferentes estão juntas. Enquanto, muitas vezes, mesmo tendo muitos pontos em comum, não se unam. É como uma rede WI-FI, que precisa de uma senha para que possa haver a conexão. Senha que independe de palavras e de atitudes. Mas de um encontro que vai além dos sentidos. Ondas e frequências, além do papável e concreto, como emissões e captações. Talvez uma necessidade, como bateria e fonte, que se retroalimentem para o funcionamento de todo o sistema.

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Carta à uma desconhecida


Você tirou um filho
E eu nem cheguei a ter um
No seu caso, foi imposto
No meu, solidão
Você casou
Mas não foi feliz
Não casei
Mas também não fui
Você abriu mão de seus sonhos
Por alguém que nunca deu valor
Eu abri mão dos meus
Por não encontrar meu valor
Você sofreu
Eu também sofri
Cada um no seu canto
Cada um no seu conto
Vivemos dores juntos
Mas separados
Unidos na desunião
Pelos desencontros encontrados
Enquanto diz:
Antes só, que mal acompanhada
Digo:
Quando se é só, até mal acompanhado
Contradições da vida
Seria diferente
Se tivéssemos nos achado
Mas não há tempo de nos fazermos rogados
Quando me diz:
Gostaria de escrever para ser lida
Retruco:
Mesmo escrevendo, não somos
Os caminhos seguem
As coisas mudam
O que nos espera?
O que esperamos?
Nada importa
Só o nosso portar
E o acreditar no sorriso
Que ainda devemos dar

quarta-feira, 7 de junho de 2017

Feliz aniversário



Hoje completamos mais um ano
Um ano sem nos conhecer
Perdidos um do outro
Tentando nos compreender

Um ano de saudades
E que nos chamamos em vão
Um ano da carência
De não segurarmos nossas mãos

Um ano da espera
Que não sabe de que lado virá
Ou mesmo, da incerteza
De ser só um sonho, será?

Um ano dos momentos
Não partilhados
E de nossos olhares
Nem mesmo terem se achado

Um ano de expectativas
Frustradas
Como poderia ser diferente?
É sempre assim: tudo ou nada

Feliz aniversário para nós
Bodas imaginárias
De vidas sem um nó
E desencontradas

A estranha



"Quem é essa mulher?" - Pensava compulsivamente. Tentava um esforço imenso, revirando todos os escaninhos do seu
interior, mas nada. Para o desespero dele, ela não apenas olhava fixamente e sorria com uma certa intimidade, que antes
de ser receptiva, deixava-o ainda mais ansioso.
"Quem era ela? Colégio? Algum Curso? Atendente?" - Seu rosto era tão familiar, mas ainda assim, não trazia nele, nada que
o desse alguma dica do que deveria lembrar.
"Por favor, passa direto! Faz apenas um aceno!" - Refletia, quase como a prece de um pecador, cujo pecado é não lembrar, mas não adiantou,
ela se aproximou!
"E agora? O que devo dizer? Será que ela vai perceber que eu não sei quem ela é?"...
E assim começou um diálogo difícil:
- "Quanto tempo! Você não mudou nada!" - Disse ela sorrindo!
Por sua vez, deveria dizer que ela mudou muito, porque não conseguia lembrar. Mas se limitou a um constrangido:
"Sim, muito tempo, mas você está ótima".
- "Como vão as coisas com os seus pais?" - Continuou para seu desespero.
- "Eles estão bem!" - Será que deveria perguntar dos dela? E se tiverem morrido? Se ela for adotada? Não sabia quem era essa mulher), mas novamente, tentou uma tangente: "Sua família está bem?"
- "ah! Que bom perguntar deles, eles estão ótimos e morrem de saudade de você!"
Bem, não bastasse não lembrar dela, agora, sentia-se duplamente culpado, porque não lembrava de uma família inteira que tinha saudades dele.
- "E os relacionamentos?" - Inquiriu ela com segurança...
Será que ela não ia parar nunca? Como sustentar uma conversa com alguém que sabe quem é, quando pouco sabe dela?
- "Continuo solteiro, mas estou bem." Viu que usava uma aliança e emendou: "E seu marido?"
- "Ah estamos bem! Planejando aumentar a família em breve" - Sorriu despretensiosamente.
Acho que nunca foi tão religioso como naquele momento, porque rezava aos céus por uma salvação e acredite, os céus escutam....
"Maria, o que você está fazendo com este homem?" - Uma voz que parecia vir do além, interrompia àquele momento.
"Este é o Bruno, meu amigo de infância, que não via há anos" - Ela respondeu, olhando na direção do inquisidor.
- "Mas peraí, eu não me chamo Bruno. Sou o Paulo!" - Repentinamente, sua voz interior falou, quebrando àquele momento.
- "Como assim Paulo, Bruno? Você sempre brincalhão!" - Ela parecia não acreditar e seu marido (julgava ele), estava completamente perdido na situação.
- "Sim, Paulo, advogado, solteiro e morador de Laranjeiras". Disse, voltando à respirar...
- "Sério, que você não é o Bruno?" - ela parecia incrédula e só faltou pedir um beliscão para acordar, mas não o fez felizmente.
- "Infelizmente, sim! Sinto muito!" - disse ele, numa tentativa de consolar o desencontro..
- "Mas porque você continuou o diálogo, se não me conhecia?" - O tom dela havia mudado, parecia desconfiada e logo, se segurou no braço do marido,
clamando proteção.
- "Porque a achei familiar, poderia ser alguém que eu não estivesse lembrando. Mas desejo felicidades à vocês e ao Bruno, se de fato o encontrar" - Virou e
saiu andando, enquanto ao fundo, ouvia esposa e marido se estranhando por um estranho.
"Ainda bem que minha memória não está tão ruim assim." - Afirmou, enquanto caminhava, sentindo como se houvesse passado em uma difícil prova. Riu sozinho.

domingo, 4 de junho de 2017

Monges contemporâneos


Sempre quando pensamos em monges, pensamos na clausura e renúncias de um monastério. Mas quantas prisões existem do lado de fora dos portões? Vou além, quantos corpos são monastérios com almas aprisionadas dentro deles?
O monastério protege o monge das tentações do mundo, no entanto, estar vivo é uma tentação e não há nada que possamos fazer para nos proteger de nós mesmos. Certo, podemos meditar, mas a meditação nada mais é do que a compreensão que todo processo começa e termina dentro de nós e em si mesmo.
Somos nossa própria ilha e isolamento. Uma ilha impenetrável por maior abertura e transparência que tentemos passar.
Podemos apontar uma direção do que somos, mas ninguém poderá entrar em nós e se deparar com toda a complexidade e contradições que nos habita. Podemos simplificar e resumir, ainda que não exista síntese que consiga a proeza de fazer de uma parte o todo.
Viver é uma renúncia, desde do nascimento, que abandonamos o útero até a morte, que abandonamos o corpo, que também é o nosso templo.
Que não esperemos a morte para abrir as nossas portas. Que cada passo possa ser dado de peito aberto. Não é o exterior que nos corrompe, antes o que trazemos dentro de nós.

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Sustentabilidade emocional


Nunca se falou tanto em sustentabilidade, no entanto, como podem os homens resolverem problemas fora de si, sem entender os que existem dentro?
Ainda pensamos a natureza como uma realidade exterior, sem nos sentirmos parte da mesma ou mesmo como parte de nós. Mas a insustentabilidade do mundo, começa justamente pela insustentabilidade interior da natureza humana. Nos preocupamos com as gerações futuras e o que temos legado à elas há séculos? Pensamentos conturbados, sensibilidades omitidas, instabilidades...Exploramos os recursos interiores sem dar nada para o meio que somos convidados a estar. Não é isso, o desmatamento? Desmatamos idéias e sentimentos com o mesmo vigor. Poluímos os 70% de água que nosso corpo é constituído com mágoas, amarguras, etc...Rios e mares são apenas um espelho narcísico!
Somos formados de energias que alimentam o funcionamento da usina cérebro e mantém unidos os átomos que somos constituídos... E quanto desperdiçamos com atitudes sem propósito, criando dificuldades e guerreando contra o mundo? Sempre precisando de muito para o pouco que nos dispomos a dar.
Mudanças serão efetivas, quando o ser humano, mais do que cuidar do meio que vive, começar a pensar como ele vive no meio.
Como se dá e recebe, como usa os recursos que a vida oferece... Especialmente, entender que somos uma inteligência coletiva, na qual tudo está integrado. Que nada que fazemos é ação isolada, mas tudo terá reflexos à curto ou longo prazo. Não estamos lutando pela sobrevivência dos relacionamentos em um futuro, mas por viver plenamente no presente! O mundo que vivemos é o mundo que guardamos dentro de nós.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

O valor de um relacionamento


É estranho colocar na mesma frase: "valor" e "relacionamento". Uma vez, que um é baseado na materialidade racional e outro, na subjetividade emocional. Mas em um momento, que o mercado financeiro/ consumo, é mais presente do que nunca na vida das pessoas, cabe uma tentativa de aproximar, senão em significado, mas em metáforas que façam um paralelo entre os dois mundos.
É um fato, que o sujeito não pode ser mensurado e logo, atribuir um valor à ele. Ainda assim, em nenhum momento perdemos essa balança que pesa as pessoas, rememorando o Deus egípcio Anubis, que pesava corações e só liberava a passagem para a morte, se este fosse mais leve que uma pena.
E se aprofundando nesses pesos e medidas imaginários, chegamos à famosa lei do comércio: "Oferta e procura". Não estou mercantilizando às relações, mas ainda baseamos muito do que sentimos pela disposição de alguém se ofertar ou pela procura que recebemos. Hipo e hiper valorizando expectativas.
E assim, os sentimentos então entram numa relação financeira de mercado. Quando as ações caem, qualquer um adquire por um baixo risco. Mas se as ações sobem, não apenas o risco aumenta, mas apenas quem realmente é capaz de investir, adquire. Ainda assim, ações em alta, lucros maiores, ações em baixa, lucros menores.
E assim fazemos de acordo com nossa autoestima. Nos doando de graça e sem risco à qualquer oportunidade por pior que seja, quando a estima cai e selecionando bem quem entra, quando a autoestima sobe. As vezes, investimos demais em algo imprevisível e nos deparamos com a quebra da bolsa e de nossos corações também!
É certo que ninguém pode comprar ou vender uma emoção, mas a forma como a projetamos no mundo, acaba por criar um valor imaginário. Mesmo valor imaginário, que um dia atribuiu importância à uma moeda.
A importância que damos as coisas, sejam materiais ou emocionais, atribui o valor que elas tem (ou que julgamos ter). Não aposte seu coração (Curiosamente, um eletrocardiograma é muito parecido com os gráficos da bolsa de valores). Não faça investimentos loucos que possam lhe tirar tudo que tem. E nem seja, prudente demais, para que o que tem de mais valor, fique estagnado. Sempre voltamos à balança e com ela, a necessidade de equilíbrio.