terça-feira, 30 de junho de 2015
A palavra lançada
Grande mal é a palavra lançada
Que como lança atravessa a lavra
De sentimentos, por tanto tempo, cultivados
Como geada, a terra perde
Como Pandora, ao mal cede
Sem volta ou apenas legando revolta
Nos olhos que um dia brilharam
E agora marejam na desesperança
De quem um dia encantou e agora tirou a temperança
Como dito é um vidro quebrado
Cujos estilhaços não podem ser consertados
E diferente de riscos por um triz, só perdura uma cicatriz
Uma condenação perpétua e sem reparação
De mútua flagelação, que ainda que mude a ação,
O tempo congelou em breve instante impensado
A palavra lançada é uma verborragia
Uma hemorragia da alma
Vocifera a inconformação
Como uma fera sem calma
Quando o momento passa
Uma cruz, o peito transpassa
De tudo que poderia ter sido
Se quem mais admira não tivesse ferido
domingo, 28 de junho de 2015
Parte IV - A mulher: Os olhos
Um olhar que passa sorrateiro
Um ar que enlaça por inteiro
Provocação silenciosa de um mistério
Ação graciosa em refrigério
Deslizam disfarçados
Esticam quando tentados
Tudo observa e analisa
Com a reserva que paralisa
Puxados ou arredondados
Claros, escuros ou delineados
Apagados ou brilhantes
Um chamado ao seu semblante
Entrada de sua alma
Estrada nem sempre calma
Difícil esconder algo deles
Fácil se perder logo neles
quarta-feira, 24 de junho de 2015
Confissão
Pensei muito se deveria ou não escrever esse texto. No entanto, percebi que estava sendo preconceituoso comigo mesmo. Em um período que se debate tanto a questão das "minorias", nunca fomos incluídos nas mesmas, apesar do mundo fingir que não existimos. Espero que não se choquem, mas eu tenho caspa.
Engraçado que tentar disfarçar essa característica é exatamente como fingir que estamos acordados, quando a nossa cabeça tomba em lapsos de sono, sentados em algum lugar. Fora isso, roupas escuras, não nos negam.
Como a Hidra da mitologia grega, que para cada cabeça arrancada, nasciam mais duas. A caspa é incurável e para cada uma que cai, mais 1000 ameaçam cair. E nessa tentativa de equilibrarmos a cabeça ao máximo para disfarçar essa realidade para o mundo, somos surpreendidos com a sensibilidade de alguns que questionam: "É contagioso? Sua higiene é bem feita?"
Nesses momentos me sinto na Idade Média, que um médico vestido de preto, com uma máscara horripilante, semelhante a um pássaro (acreditava-se que desta forma, evitavam o contágio da peste negra), receitava: "Para cura de sua doença, precisará tomar um banho de mar, sob o ciclo da lua cheia."
Bem, felizmente, nossos curandeiros modernos, vestem branco, são eles, os dermatologistas.
Antes de continuar, preciso esclarecer: Não é contagioso e sim, minha higiene é impecável. Feita essa ressalva, continuemos...
A caspa é um processo alérgico, uma inflamação imperceptível do couro cabeludo, que provoca uma descamação excessiva de pele no mesmo. Muito similar, ocorre quando vamos a praia, queimamos muito e descascamos. Porém, a nossa troca de pele é permanente.
Não há cura, porém é possível amenizar os sintomas. Minha cabeça é um laboratório e nem estou falando internamente, pois de fato, já tentei a mistura de todas as químicas possíveis. Algumas são mais eficazes, outras nem tanto, mas o Zinco é o elemento chave da questão, sendo mais preciso: Pitirionato de Zinco. (Neste momento, meu professor de química teria orgulho de mim por finalmente ter entendido alguma coisa de sua matéria).
Em casos extremos, em doses mínimas e por curto período, cremes com base de cortisona ou cortisol, podem conter o processo.Usar roupas claras, não faz parte do tratamento, é apenas um paliativo ou como diria o Cazuza: "Faz parte do meu show".
Passamos a maior parte da nossa infância, buscando a aceitação dos pais. Na adolescência, mudamos o nosso objetivo, queremos ser aceitos socialmente. E em que momento, enfim, nos aceitamos?
Felizmente, para o bem e para o mal, somos todos diferentes. E é uma libertação, quando finalmente, temos consciência disso e somos capazes de não nos levar tão a sério e melhor do que isso, não nos importarmos tanto com o que nos é dito. Voltando a atualidade: não é uma opção, é uma condição! Logo, eu assumo, agora sem máscara: tenho caspa!
segunda-feira, 22 de junho de 2015
Reclamação
Uns reclamam das companhias
Outros da solidão
Uns reclamam por não receber amor
outros de não ter para quem doar
Uns reclamam por serem diferentes
Outros por se sentirem entre iguais
Uns reclamam das condições de trabalho
Outros por não terem condições de trabalhar
Uns reclamam da insatisfação com detalhes do corpo
Outros pela necessidade de reparar uma parte do mesmo
Uns reclamam de não ter tempo para nada
Outros da monotonia de ter muito tempo vago
Uns reclamam do lugar onde estão
Outros do lugar para onde foram
Uns reclamam por ter de sair
Outros por não ter para onde ir
Uns reclamam da ilusão,
Outros da realidade
Uns reclamam de suas escolhas
Outros por não saber o que escolher
Uns reclamam dos seus problemas
E outros também
Entre a reclamação de uns e de outros,
Legítima ou vitimada, habita a real necessidade
Possibilidade de encarar cada momento
Habilidade de aceitar pelo pensamento
A transformação que é instrumento da ação
Fazendo da maior dificuldade, uma oportunidade e lição
domingo, 21 de junho de 2015
Uma casa praiana
Depois de uma longa viagem de carro para passar o fim de semana no litoral, buscando o repouso e o distanciamento das obrigações habituais, chegamos ávidos para retirar as malas e esticarmos as pernas.
O portão de madeira desgastada exigia que um de nós saísse antes, removesse uma larga trava transversal para que enfim, pudéssemos estacionar.
A grama estava alta. Fazia algum tempo que ninguém visitava aquele lugar. Chegamos a varanda aprazível e com a chave em riste, a velha porta se abria em um alto rangido...
Tudo estava escuro, empoeirado e um forte cheiro de mofo gerou uma sinfonia de espirros. Acendemos a fraca luz de pendentes e deixamos os corpos recaírem sobre os sofás encapados, alardeados com o trabalho daqui para frente.
A sala se integrava com a cozinha em um sistema de bancada alta americana. Tijolos pintados de branco, atualmente amarelados,
revestiam todas as paredes. Nos fundos da casa, existia um pequeno quintal mal cuidado com heras se apoderando pelos muros da divisa com o outro terreno.
O pai na tentativa de melhorar os ânimos, começou a posicionar as cadeiras que estavam viradas sobre a mesa e alegre falou: - " Olha , uma vassoura!" - apontando para uma, cujas cerdas pareciam ter sido devoradas por um jacaré!
Discretamente, começou a varrer, ou melhor, espalhar a poeira, que levantou, como uma nuvem esbranquiçada, iniciando um novo ato de espirros coletivos.
A filha, com aproximadamente 14 anos, já entediada com a viagem, antes mesmo dela ter começado, logo se encantou pela possibilidade de uma televisão.
De fato, existia uma: valvulada e com antigo sistema de caixa amadeirada com duas antenas imensas. Pela quantidade de bombril nas pontas, indicava que qualquer tentativa de assistir qualquer coisa ali, seria mais difícil do que um contato de
1º grau com extraterrestres.
O filho, ainda criança, com 8 anos, abriu a mala, espalhando tudo pelo chão para encontrar um brinquedo. Encontrou uma rede esfarrapada em uma estante aberta e fez birra até que o pai cansado da resistência a instalasse na varanda. Dali não mais saiu.
A mãe se dirigiu ao único banheiro que havia na casa. Esperava tomar um banho relaxante e esquecer um pouco todo aquele cenário. Logo constatou, que o aquecimento não funcionava e a água estava gelada.
Para piorar a situação, se deparou com um imenso sapo dentro do box. Saiu correndo, praticamente despida e gritando.
O pai se assustou e veio correndo ao seu encontro. Ela demorou a conseguir explicar o que ocorria, mas logo que recuperou a razão, assumiu uma postura autoritária: -"Aqui eu não fico com este
bicho, ou eu ou ele!".
O sapo parecia mais assustado do que qualquer outro ali e talvez por isso mesmo, sem oferecer resistência, saiu pulando até o quintal do fundo.
O colchão dos quartos era apoiado em um bloco de alvenaria e estava rasgado, saindo a espuma, porém para não criar nenhum alvoroço, o pai rapidamente os virou ao contrário para disfarçar a situação.
Resolveram fazer o primeiro programa familiar. Uma visita ao supermercado para adquirirem algumas coisas que faltavam. Perguntaram aos moradores locais onde poderiam encontrar um e se dirigiram a ele.
Quase 5 quadras depois, chegaram. Não era bem um supermercado, como estavam acostumados. Era uma espécie de armazém. Vendiam de tudo: vestiário, revistas, remédios, alimentos, etc...
Enquanto os pais se ocupavam de providenciar o necessário, os filhos pareciam perplexos, como se estivessem em outro planeta. Voltaram bastante carregados, todos com pelo menos duas sacolas em cada mão.
O fim do dia começou a cair e um exército de pernilongos invadiu o local. Entre tapas e coceira nos braços, fecharam todas as telas que haviam por dentro das janelas. Infelizmente, esqueceram o repelente.
O pai, neste ínterim, foi tomar seu merecido banho. Quando saiu, animado para que fossem ao centro da cidade, jantar fora...Se apiedou da cena que encontrou...Todos caídos, um em cada canto, mortos, exauridos e dormindo...Vencido pela maioria, se juntou a eles...
Acordaram no dia seguinte com o barulho de uma chuva torrencial, que escorria pelas telhas francesas. Espiaram pela janela e o chão da rua, que era de terra, havia virado um lamaçal. A idealizada praia, agora, parecia um sonho distante e tiveram que se contentar com a companhia uns dos outros entre jogos de baralho.
O final de semana, havia passado, sem vivenciar a maior parte do que se propuseram. Arrumaram tudo, fecharam a casa mais uma vez e voltaram com as malas para o carro.
O pai, sempre otimista, já na estrada de volta, falou: "Pelo menos, tivemos a oportunidade de passar um tempo maravilhoso juntos". Todos suspiraram, parecendo concordar, no entanto, se pudessem teriam apenas dito: "Que alívio que estamos indo embora".
E como em nenhum outro momento, em todo final de semana, relaxaram...
terça-feira, 9 de junho de 2015
Perdão
Por nem sempre dar o que deveriam esperar
Por as vezes escrever coisas que não consigo enxergar
Perdido em pensamentos, tentando entender o momento
Por as vezes escrever coisas que não consigo enxergar
Perdido em pensamentos, tentando entender o momento
Perdoem amigos por faltar
Reclamam com razão a ausência que há
Reclamam com razão a ausência que há
Por não querer saturá-los de incoerências
Mas não é por falta de amor, antes, talvez por excesso
Da dor que crio e não cesso
Ao me doar como se fosse o próprio ar
Da dor que crio e não cesso
Ao me doar como se fosse o próprio ar
Perdoem amigos por acomodar
Esperar que as coisas possam mudar,
Enquanto sem querer, vejo-os afastar
Pela minha inaptidão de nem sempre retribuir o que me dão
Pela minha inaptidão de nem sempre retribuir o que me dão
Perdoem amigos por omitir
Tudo aquilo que não deixo de sentir
A intensidade que não cala
A timidez que fala
Tudo aquilo que não deixo de sentir
A intensidade que não cala
A timidez que fala
Se ainda assim, me perdoarem e apesar dos meus erros, me aceitarem
Que eu possa fazer alguma diferença em suas vidas
Que traga algum bem com minha presença, apesar das idas e vindas
Que traga algum bem com minha presença, apesar das idas e vindas
Pensamento: A-mor(te)
"Tantas vezes no passado, flertei iludido com a indiferença da morte, que acabei enamorado e me encontrei no amor da vida."
domingo, 7 de junho de 2015
Cicatrizes
Cicatriz que marcou uma ação
Emoção que ficou por um triz
Lembrança permanente na pele
Leve e imanente cobrança
Dor que passa, mas não se esquece
Sinal que padece e descompassa com ardor
Na presença que a alma guarda
Alarma a calma em uma sentença
Andar junto ao transcorrido
Decorrido conjunto ao se dar
Enfrentar a nova tatuagem que suavize
Amenize com a coragem de lutar.
Idade Média Brasileira do Século XXI
De presidência à regência
De coligações livres partidárias a ligações nobres hereditárias
De remedo de favelas a feudos singelos
Esfaquear ao roubar a saquear ou pilhar
Tesouro das receitas estaduais a ouro e colheita de cereais
Inesperadas legiões arbitrárias de fanáticos a Cruzadas de religiões autoritárias de lunáticos
Dengue como moléstia ao sangue com a peste
Ciclos que não diferem, reciclam tudo aquilo que fere
Até que a consciência do que há, desperte a inteligência de mudar.
quinta-feira, 4 de junho de 2015
Divisões
Alguns milhões de anos atrás, a humanidade, ainda animalizada, lutou uns com os outros pelo domínio do fogo.
Dos cultos e rituais para velar os mortos à tentativa de definição dos mistérios do corpo e da alma, nasceu a religião fundida a ciência. Primeiro, a ciência rompeu com a religião. Posteriormente, religiões perseguiram religiões.
Homens e mulheres, evoluíram juntos. Homens caçando o sustento e as mulheres gerando a vida até que o homem caçou a mulher e a subjugou.
Os territórios provedores se tornaram pequenos e passaram a ambicionar as terras alheias.
Séculos passaram e as disputas viraram guerras armadas. Cultura consumindo cultura. A vida de uns, provocando por ideal, a morte de outros.
Tudo isso a história revelou. No entanto, ao invés de ensinar, continuaram as divisões...
A intolerância da fé...
A distinção das raças...
A negação da condição sexual...
A disputa entre classes sociais...
Grupos se repartindo em grupos menores. Diferenças confrontando diferenças.
E no ponto primordial e igual, no qual, tudo se une, esquecemos: "Somos humanos."
terça-feira, 2 de junho de 2015
O mundo sem rima dos adultos
"Os cabelos, agora, rareiam
Onde tinha agora falta
Marcas involuntárias e estranhas
Se tornam permanentes "tatuagens"
No espelho vive um estranho
Cuja convivência é imposta
Os remédios antes tão raros
Eclodem de todo lugar
A disposição de dominar o mundo
Se contenta com o silêncio do quarto dos fundos
As novidades já não são tão novas
E as histórias se repetem
As adversidades são vistas com a cautela
Que adolescentes não queriam acreditar
Nada mais parece definitivo
Tudo é transitório
A vida se torna tão séria
Que só se ri nos intervalos
O impossível não mais cabe no possível
E a percepção se torna melhor do que a visão
O tempo tão lento, voa
E os passos antes tão rápidos, desaceleram
Aquilo que se deixa para amanhã
Será redescoberto no próximo ano
Aquele desconforto apontado na educação dos pais
Agora são vividos nas cobranças dos filhos
O que antes se esquecia com facilidade
Agora é lembrado com saudade
As tristezas passadas se tornaram piadas
Algumas piadas não tem mais graça
Mas diante de uma criança
O adulto se redescobre e com(o) ela brinca
Esquece o trabalho, as cobranças e as culpas
E simplesmente sonha
Voltando a ser
Aquilo que perdeu ou não viu passar"
O sentimento da leitura
Popularmente, diante de uma mágoa, é comum escutarmos: "Não quero amar mais ninguém". Como se pudéssemos determinar o que sentimos. Racionalmente negamos, mas o sentimento é sempre uma afirmação e involuntário. E a única forma de mudarmos um sentimento é dando abertura a outro sentimento. Podemos até represar o que sentimos, sofrendo internamente a força da emoção negada, mas é impossível secar uma nascente contínua e infinita.
Somos um universo complexo. Trazemos dentro de nós, milhares de personalidades que coexistem e se manifestam de acordo com cada situação. E é por isso que um livro ou uma leitura tem o poder de transportar quem lê e mesmo quem escreve para realidades inimagináveis, produzindo alegrias, tristezas, afinidades e antagonismos.
O livro é uma entrega voluntária. Nos permitimos e nos submetemos as experiências ali relatadas. Enquanto lemos, a fantasia converte-se em realidade. A abstração dá lugar ao concreto e nesse processo, sentimos. Não há controle racional sobre as ações, logo a emoção é que domina como passaremos pela situação ali determinada.
Transforme este exercício literário em um processo meditativo e prático. Não negando as emoções e se permitindo viver o que sente. Fazendo dos sentimentos, um reencontro consigo mesmo(a) e deste reencontro, uma nova forma de manifestar quem é.
Leia a situação que vive e viva tudo aquilo que ler.
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