domingo, 14 de março de 2021

A beleza da imperfeição



Sempre vi alguma beleza em objetos quebrados, talvez porque aquela “falta” me obrigasse a completar mentalmente a parte, como um quebra cabeça. Ao mesmo tempo, que tirava o foco do todo para me atentar a outros detalhes, que talvez não os perceberia em sua inteireza.
Curiosamente, em tempos de viajantes compulsivos, ruínas nunca foram tão valorizadas. Mesmo que seja ignorado o contexto histórico, se sabe inconscientemente, que aqueles restos guardam a memória da humanidade. A lembrança que as mais grandiosas civilizações ruíram para o surgimento de novas eras. A destruição que inspira um recomeço. Ou simplesmente, uma selfie que vale ouro.
Ouro esse que também é usado por japoneses em uma técnica chamada Kintsugi, que ao invés de restaurar uma cerâmica quebrada, evidencia a emenda com um filete de ouro: a beleza das cicatrizes.
E porque valorizamos as imperfeições da arte, mas temos vergonha das nossas próprias? Aquelas que trazemos no corpo ou na alma?
Cada cicatriz também conta uma história, são as ruínas ou superações pessoais que permitiram o início de um novo ciclo ou entendimento do que somos ou nos tornamos.
Os vikings ostentavam suas cicatrizes como símbolo de força, pois cada uma representava uma batalha vencida. No entanto, hoje, expor uma marca é sinal de fraqueza. E porque?
Porque somos “filhos” do marketing e fraqueza não vende! Nunca foi um bom comercial. Ja viram comerciais de bebida mostrando alguém com cirrose?
O problema que não somos produtos, mas passamos a nos apresentar como tais. Expondo qualidades para que os outros “comprem” essa ideia. Mesmo que muitas vezes, nos violentemos no processo.
Consequência? Dores reprimidas, vozes sufocadas e “quebrados” que embora nos façam únicos, preferimos esconder para atender a idealização de um molde perfeito! Molde que nem sabemos quem instituiu, idealizado para corpos e pensamentos, que nem cabemos.
Essa omissão vem nos custando caro. A sociedade entrou em colapso, como aquelas mesmas ruínas, que hoje ostentamos.
Quando tentar vier antes de ostentar, entenderemos que beleza é o conjunto de todas as partes e que basta uma letra para consertar a impEr-feição e a tornar uma feição ímpAr.
<Fernando Paz>

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